Na lógica matemática o estudo das proposições e suas implicações é
fundamental para que possamos compreender a natureza dos julgamentos,
especialmente, quanto a sua validade. Isso importa, porque a linguagem
matemática se baseia no raciocínio lógico, ou seja, se partimos de premissas
erradas não poderemos chegar a conclusões corretas.
Os recentes
desdobramentos do cenário político nacional, nas mudanças quase que semanais,
de alguns ministros, cuja importância estratégica para o País é vital, como
Saúde e Educação, por exemplo, me fizeram voltar às aulas de lógica.
Não irei
discorrer sobre os motivos que levaram a saída de um ou outro ministro. Não
discutirei a postura do atual Presidente da República no enfrentamento da
terrível crise sanitária que atravessamos. Aliás, nem pretendo atacar o governo
ou defender governos passados, há tempos tenho me policiado no sentido de
superar o discurso dicotômico, letárgico e, às vezes, fanático seja em prol de
qual lado for.
Há poucas semanas
uma das pastas mais importantes do governo, o Ministério da Educação, perdeu
seu ministro. O primeiro ministro, Velez, parecia não ter competência para o
cargo e sucumbiu rapidamente. O Segundo, Weintraub, envolvido em sucessivas
confusões e repetitivos discursos desastrosos, fez uma cruzada contra
universidades públicas com o discurso ideológico e perverso. Fez até a dancinha
da chuva, cômico, se não fosse trágico. E o terceiro? Até o fechamento dessa
edição não se sabe, quase foi o Decotelli, quase.
O fato é que
Velez, Weintraub e quase Decotelli, não conseguiram dar conta das urgências e
da complexidade da pasta. A discussão sobre o FUNDEB, isso mesmo, aquele fundo
que é responsável pelo financiamento da maior parte das despesas da Educação,
encontra-se estagnada. As políticas de alfabetização pararam. Mas o problema
era “Paulo Freire” e seu método. O problema era o discurso de gênero nas
escolas. O problema era a doutrinação marxista. Sim, digo isso por que li o
plano de governo do atual Presidente, um “PowerPoint” de 80 (oitenta) e poucas
páginas, e na parte da Educação apontava esses pontos como problemas da nossa
Educação. Nenhuma política séria foi implantada. (ahh) “Mas teve aumento
salarial”, que por acaso estava previsto no plano nacional de educação como uma
obrigatoriedade e não como benevolência de gestores.
Na Educação ações
e resultados positivos não são diretamente proporcionais. A política pública de
hoje gera benefícios lentamente, as mudanças não são do dia para a noite. Do
mesmo modo que ausência dessas ações perdura por gerações.
Dito isto, agora podemos voltar à lógica
matemática. Sim, porque nas últimas semanas a Educação virou notícia. O
ministro que saiu, “para evitar ser preso”, excelente narrativa para quem gosta
de teorias conspiratórias, deixou o cargo vago e o ministro indicado parecia
ter as qualificações necessárias.
Após o anúncio da indicação de Decotelli, choveram
cards e mensagens nas redes sociais, dos seguidores do Presidente, com
expressões do tipo “agora temos um negro como ministro da educação”. Esse tipo
de expressão é fundamentalmente racista, pois a celebração deveria ser pela
capacidade técnica dele e não pela cor da sua pele. Não existe branco ou preto
competente, existem “pessoas” competentes ou não. Do mesmo modo, após descobrir
que as informações do seu currículo estavam equivocadas, apareceram cards e
mensagens nas mesmas redes, agora dos dois lados, com frases “o nego mentiu”,
“além de negro...”, agora o racismo institucional se escancara, se declara mais
“claramente”.
E o que tem isso haver com lógica matemática? Já me
explico. Ora, de fato, ao ser alçado ao cargo de Ministro da Educação,
Decotelli, teve sua vida varrida, ainda mais nesses tempos de Internet e caiu
num erro crasso. Mentir sobre sua formação. Isso, o título de Doutor não havia
sido conferido. Isso foi a ponta da linha que o levou a desistência do cargo
sem nem assumir. Curioso é que erros semelhantes foram cometidos por alguns dos
atuais ministros, disseram ter a formação que não tinham, embora ainda
continuem no cargo.
E agora sim, podemos falar de lógica formal. Os
termos condição necessária e suficiente se referem à relação de implicação
entre duas proposições. Por exemplo, Se João é pernambucano, ele é brasileiro,
“ser pernambucano” é condição suficiente para ele ser brasileiro. No entanto,
“ser brasileiro” não é condição suficiente para ser pernambucano. Nesse caso
ser Brasileiro é uma condição necessária para ser pernambucano. Não existem
pernambucanos nascidos no Japão.
E aqui fica a
reflexão: é preciso ser Doutor para ser competente? Conheço inúmeros
professores e gestores que não o são, mas são competentes, do mesmo modo, que
conheço alguns doutores, cuja formação humana, passa longe do título que ostentam.
Qual o proposito
de mentir, dizendo ter um título que não possuí? O diploma é uma condição
necessária para certos cargos, mas não é suficiente para atestar competência. Já
a ética universal, aquela do (por muitos maldito) Paulo Freire, é necessária e
suficiente, uma dupla implicação, para exercício de qualquer que seja a função
social e humana.
Em sua ética
universal, por exemplo, mentir é errado e ponto. Minhas palavras ganham corpo
na prática de minhas ações. O doutorado, para muitos um sonho, é uma etapa
singular de nossa formação acadêmica, especialmente, para quem trilha o caminho
da docência, mas o título por si só, não é garantia para que sejamos bons
profissionais. Mas a questão por traz do “fetiche” de se apresentar como
doutor, tendo que mentir é bem mais complexa.
Se vivêssemos numa sociedade mais justa, por
exemplo, ter doutorado não seria algo extraordinário para quem estuda, mas
aqui, onde pobres e pretos seguem morrendo e à margem da sociedade e das
políticas públicas, tudo depende de uma confluência de oportunidades. Conheço
amigos que abriram mão de muito para chegar lá, e hoje, seu pagamento a
sociedade é ajudar outros a trilhar o mesmo caminho, eu chamo isso de
compromisso e competência. Mas sabemos que infelizmente, muitos ainda não têm o
direito de se quer ir para universidade ou de permanecer nela.
|
Dr. Jose Luiz Cavalcante |
Nosso papel, como educadores é ajudar essas
pessoas, fazendo do direito à educação um processo natural, não um privilégio
de poucos. Ser doutor não basta, mas dizer que é sem ser é desnecessário, como
vó já dizia: “- mentira tem perna curta, meu filho”.
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